Irmãos itarantienses: Eu sinto por ter
sonhado todos os sonhos que não consegui acordar. Posso dizer-lhes, mergulhei
tão fundo no sonho de vocês, que pouco me importei com a realidade que se
passava em torno das necessidades mais próximas ao meu redor. Eu quase não
cuidei das pessoas que mais esperavam e precisavam de meus cuidados. Mergulhei
tão intimamente na alma de meu povo ancestral, que cheguei a esquecer de minha
realidade factual.
Minhas ideias foram sempre as mesmas em
essências, de acordo ao seu tempo vivido. Em minha liberdade rebelde,
questionadora e constante, enfrentei lutas difíceis, ignorando regras e
conveniências e gritando num lamento surdo e profundo. Ao decorrer do tempo,
uma geração política inteira floresceu comigo. Tenho muito orgulho e, também,
não posso me negar por venturas tantas decepções...
Nesse período, desejo que o agora
prefeito Fábio Gusmão cumpra a missão que o povo lhe confiou, com discernimento
e prudência, sem se deixar ser convencido e evolvido nas teias dos sussurrantes
de palavras suaves e doces — cuidado com o doce. Que ele possa ouvir outros que
têm muito a dizer e, quem sabe, o sentimento abstrato das obras do performático
artista plástico Jaime Figura, luz de nossa última conversa, agosto de 2020,
lhe faça compreender a razão do tempo para a continuidade da história: a
história de nosso povo.
***
RECORTES LITERÁRIOS
A fotografia que ilustra esse artigo,
revela de forma material o ambiente cêntrico de meu primeiro livro, e permeia
as narrativas de todos os outros que se passam na cidade de São Paulo. De meus
dez livros, sete se passam na megalópole de recortes que se encontram em suas
esquinas indefinidas.
Estação 94 – [...] Era o delírio de
uma pobre desgraçada que se encolhia solitária num canto da Praça Júlio
Prestes. Lágrimas ralas escoriam em seu rosto pálido e se misturavam a
gotículas que caiam insistentes. Seu corpo esquelético e seus olhos
semicerrados eram como o tempo insensível. [...] Quando desembarcou
na rodoviária que funcionava nas imediações da Praça Júlio Prestes, confirmou
seu encantamento. [...] Embasbacado estava quase paralisado
com tudo que lhe era novo, estranho e belo.
A praça e o emblemático edifício se
tornam cenários constantes nos outros dois livros da trilogia (Vale dos
Mundos Paralelos e Silêncio, Rosas e Ruínas).
Aquele espaço urbano volta a aparecer
imponente em Iluminante e Com Sequência. Mas, se
torna o ponto central e concentra de forma decisiva as narrativas do
conto, Cidade Imaginada:
[...] São
catorze horas e vinte minutos, tenho 15 anos e não sei explicar o que faço
neste edifício gigantesco e acinzentado que parece parado no tempo.
Eu compreendi a imaterialidade daquele
prédio, exatamente quando tinha quinze anos. No entanto, porém, meu pai havia
tirado uma fotografia comigo naquela praça, diante o edifício, quando eu tinha
um ano de vida. O registro foi revelado em monóculo fotográfico. Infelizmente,
não resistiu às corrosões do tempo. Possa ser que, aquela fotografia tenha me
lançado ao destino predeterminado...
Escrevi meus sentimentos em Cidade
Imaginada: Quando o trem estacionou manso quase sem ruído na
plataforma da estação, prendi a respiração e, chorando em silêncio, inseri o
bilhete para cruzar a catraca. Embarcado, da janela, voltei a olhar o hall de
entrada do prédio acinzentado, onde me vi garoto: inocente apaixonado e
sonhando com a cidade imaginada além do tempo...
***
Sou um escritor de imaginação pura. A
matéria essencial de meu trabalho é a perspectiva de imaginar mundos a partir
de suas factualidades. Desde minha formação de consciência foi assim. Em
Itarantim, a escrita foi instrumento de viver. Estando entre vocês, fui um
ativista político-social e cultural. Com vocês, participei de 07 campanhas
eleitorais de escolhas municipais: em todas, escrevi ideias e projetos em
muitos textos lidos pelos candidatos e publicadas como mensagens coletivizadas.
De 1996 a 2020, meus textos foram matérias de campanhas para Ricardo Souto,
Cláudio Tonucci e Kleber Fonseca; Paulo Fernandes, Fábio Gusmão e Du Almeida.
Artista lítero-cultural, estou de volta
ao meu grande imaginário: Minha linda São Paulo; minha imaginação mais latente
e lancinante. No entanto, sou um átomo que se rompeu de Itarantim para o mundo
virado. Sou osasquense e paulista de nascimento; soteropolitano de paixão e
itarantiense de alma. Sou mais resultado de vocês em minha terra
ancestral.
A todos, felicidades e muito obrigado!
Retorno ao blog Alerta
Itarantim e meu contato com vocês será semanalmente através de minhas
(em) perspectivas textuais políticas, sociais e culturais. Também terei uma
coluna no Crônicas de Itarantim, às quintas-feiras. Por assim ser,
nunca aceitem calados aquilo que lhes possam fazer mal.
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